Arquivo do blog

terça-feira, 19 de setembro de 2023

Diálogos em Memórias com Geovana Tabachi

 

Fonte: Arquivo pessoal de Geovana Tabachi


Entrevistada: Profª Drª Geovana Tabachi[1]


 Thaymara Assis: Professora, que honra contar com o seu depoimento no Projeto Diálogos em Memórias. O objetivo do projeto é resgatar e ressaltar a importância dos professores que compõem o Departamento de Ciências Sociais nesses 60 anos da UFF Campos.

Gostaria que comentasse um pouco sobre suas principais memórias na UFF Campos e os impactos da instituição em sua trajetória profissional.

 

Geovana Tabachi: São várias as memórias. É muito bacana essa proposta de registrar essas memórias. E o quanto elas nos impulsionam às coisas novas também. Eu venho de um momento bem diferente desse em que vocês vivem na UFF agora.

Eu vivenciei todo período na UFF de construção do Departamento de Ciências Sociais, das reuniões do Colegiado se desmembrando e das coordenações sendo criadas.

Antes éramos um departamento só, todos os cursos tinham reuniões e assembleias juntos e eram imensas. Consigo visualizar aquele monte de professores. Uma memória importante que tenho, não é necessariamente sobre questões internas da UFF, mas sobre meu processo de iniciar na UFF Campos, foi quando passei no concurso. Foi uma conquista pessoal, eu trabalhava na prefeitura municipal de Vitória/ES como socióloga, antes, estive na docência superior. Trabalhei por dois anos naquela prefeitura e realizei um trabalho muito bacana, quando fiz o concurso da UFF. Na ocasião das provas, eu estava saindo do hotel indo buscar minha nota do concurso, e eu vi a lua cheia bem na minha frente, daquelas douradas, uma coisa linda... E me veio uma sensação tão boa de vida nova, de algo novo acontecendo uma nova responsabilidade para lidar. Entrei na UFF em 2010, e com doze anos de Universidade, mesmo tendo ficado um tempo afastada, percebo que o trabalho aqui nos proporciona e nos impõe estarmos sempre atentos.

A minha memória em relação a UFF Campos é de conquista, de ver a Universidade se modificando, principalmente depois do meu retorno, com tanta gente nova participando, com alterações que podem ser notadas em nosso curso de Ciências Sociais, com nova matriz curricular, com novos professores e propostas, além de alunos com outras particularidades e comportamentos. Por pior que seja o momento histórico e político que estamos vivendo, na educação ainda temos onde nos segurarmos. Por exemplo, estar aqui, hoje, com uma aluna participando de um projeto sobre memória docente, fazendo uma entrevista, isso é muito gratificante.  Então, ter vivenciado essas e transformações, e lembrar daquela reunião dos professores, todos juntos lá em 2010, e hoje, vemos os departamentos formados e os projetos acontecendo.

Fonte: Arquivo pessoal de Geovana Tabachi

Outra boa lembrança é quando eu e a professora Andrea, criamos o grupo de pesquisa. O Motirõ Nhãdereko foi criado para dar vazão a uma temática em comum entre nós, que é a questão da memória e do patrimônio. Conseguimos realizar algumas atividades, tivemos minicursos, fizemos também um trabalho de ensino, pesquisa e extensão no curso e na Universidade para a Terceira Idade (UNITI). Foi muito bom ver os alunos envolvidos e atuando nas práticas educativas e docentes.  Isso também é uma memória forte para mim.

Outra questão importante é a autonomia que a gente conquista com a entrada no ensino superior público, fato que também tem a ver com as minhas expectativas de futuro, o meu projeto de vida e com meus desejos. Em outras palavras, sair de aluno, de repente, e estar na condição de professor, naquele espaço que você valorizou todo o seu percurso de formação e estudou muito para conquistar. É muito gratificante, muito satisfatório.

A minha trajetória sempre foi no ensino privado, dei aula por muitos anos em faculdade privada num curso de Direito por no mínimo cinco anos. Havia dias em que eu trabalhava em três faculdades, estava de manhã em um lugar, às vezes na mesma noite eu saía de uma faculdade para outra em outro local. Era uma correria e não se via resultado, trabalhava só para dar aula. Lembro de ter feito uma pesquisa em Vitória - ES, na época consegui pelo edital da prefeitura. Mas parece que não rendeu, sabe? Parece que era feita apenas para dar visibilidade à faculdade e não pela relevância do objeto, conteúdo e resultados. A Universidade precisava aparecer.

Então, sair desse ambiente em que se tem que dar aula de cinquenta minutos, sem liberar nenhum aluno antes, além de ter alguém passando no corredor observando a sua aula, alguém verificando as suas práticas e conferindo o seu programa de disciplina. Então, o trabalho na universidade pública é um grande ganho. Saber que temos responsabilidades acerca daquilo que você constrói, do programa de disciplina que você faz, da literatura e das biografias que a gente vai sugerindo. Saber que se pode fazer isso é muito bacana. Então, a UFF Campos representa esse marco para mim, nesse sentido, de uma conquista pessoal, de autonomia e da possibilidade de vislumbrar futuros. Aqui podemos criar, a gente idealiza e a gente pode inventar trabalho.

Dei aula no PROLIND/UFES (Licenciatura Intercultural Indígena), e uma amiga me chamou para participar de uma banca que seria defendida na Terra Indígena e disse que queriam fazer uma comemoração após a defesa. Eu dava aula de PP2 (Prática de Pesquisa em Ciências Sociais II) naquele mesmo dia, mas reorganizei o cronograma da disciplina para poder participar dessa banca que muito me interessava também. Isso para dizer que a gente escolhe e busca mais trabalho. Eu e a professora Andréa, que coordena o Grupo de Pesquisa Motirõ comigo, buscamos sempre algo que estimule a participação dos alunos no grupo. A Universidade é isso, é vida. Nós com nossas práticas damos vida para a instituição funcionar, então a instituição somos nós. Se formos indolentes, não atuando com nosso conhecimento, não estimulando os alunos, não tem como querer que a universidade continue pública, gratuita e de qualidade. Isso fica só no discurso. Não adianta ir para um sindicato, brigar, ir à rua e levantar bandeira. Acho que tem muito a ver com nossas práticas, com os nossos sonhos. Por isso, e, na minha trajetória pessoal, representa muito essa autonomia conquistada na UFF.

Fonte: Arquivo pessoal de Geovana Tabachi




[1] É Professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense, em Campos dos Goytacazes (COC-UFF). Doutora em Políticas Sociais na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (PPGPS-UENF), com período de doutorado sanduíche (PDSE-CAPES), na Universidade Nova de Lisboa - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Centro em Rede de Investigação em Antropologia - UNL-FCSH-CRIA (2019). Mestre em Antropologia, na Universidade Federal Fluminense (2003). Licenciatura e Bacharelado em Ciências Sociais na Universidade Federal do Espírito Santo - UFES (1997). Atua em temas como memória e patrimônio, festas e cultura popular, interculturalidade, políticas culturais, juventude e ensino de ciências sociais. Líder do Motirõ Nhaderekó Grupo de Pesquisa em Memória e Cultura; membro do Laboratório de Pesquisa e Ensino de Ciências Sociais (LAPECS-UFF); Participante do Centro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA-FCSH-UNL); participante do Grupo de Pesquisa Oficina de Estudos do Patrimônio Cultural (Oficina-UENF).

 

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário