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quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

O desafio da avaliação em tempos de COVID-19

 

                                                             Ione Moreno. SEMCOM/Fotos Públicas

Escrito por Rodrigo Piquet Saboia de Mello

 

Um dos principais vértices no processo de ensino-aprendizagem no âmbito escolar (e acadêmico) é o componente avaliação. Isto porque a ação avaliativa não é um mero instrumento burocrático de complemento da disciplina ofertada ou uma ação punitiva para aqueles alunos que não tenham atingido as metas desejadas. A avaliação é um instrumento profundo de complementação da ação pedagógica que foi desenvolvida ao longo da relação dialógica entre corpo discente e docente.

E o porquê desta discussão neste momento que deveríamos ou desejaríamos estarmos voltados para as festividades de final de ano e nos prepararmos para o ano vindouro. Porque este foi um ano absolutamente excepcional. Passamos praticamente todo 2020 sob o espectro de uma nova doença chamada COVID-19.

Em função desta doença e da falta de medicamentos comprovadamente eficazes, o mundo todo teve que se preparar para um panorama inusitado desde o ano de 1918 quando tivemos a última grande pandemia que foi a gripe espanhola. Diversos países adotaram duras medidas de restrição de circulação de pessoas com o fito de ao menos frear a expansão da doença com dois objetivos principais: evitar sobrecarregar os sistemas de saúde e se preparar para que o avanço científico possa em um curto período de tempo criar uma vacina para imunizar a humanidade.

Nesta efeméride conturbada, uma das atividades mais afetadas por sua própria peculiaridade foi o sistema escolar. Isto porque pelas escolas às vezes milhares de alunos e alunas estão em circulação diariamente e são ambientes altamente propícios para a propagação de uma doença que se transmite basicamente em contato com uma outra pessoa pelo ar quando infectada.

A Secretaria Estadual de Educação do Estado do Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ) atendendo a determinação do Governo do Estado decidiu pelo fechamento de todas as unidades escolares. Como uma forma de não desassistir completamente o corpo discente das instituições escolares, a SEEDUC-RJ implementou uma plataforma online de produção de conteúdo e interação com os alunos chamada Google Classroom. A iniciativa foi uma tentativa emergencial da Secretaria de criar algum tipo de instrumento de acompanhamento pedagógico e avaliativo dos seus milhares de alunos. No entanto, problemas de magnitude apareceram.

Em conjunto com a emergência da doença, ocorreu uma grave crise econômica, em que milhares de trabalhadores perderam os seus empregos fruto do desaquecimento das atividades produtivas. Conjugada a um país que já patinava na economia fazia tempo e do alunado normalmente de origem mais periférica do sistema estatal de ensino, a instrução remota se demonstrou um fracasso pela baixa adesão do sistema implementado.

Quando do início da execução do plano emergencial, se aventou a possibilidade de alunos e professores receberem chips de acesso à internet para que se facilitasse o acesso. Todavia, tal iniciativa não se concretizou. Pelos relatos do ambiente escolar, diversos alunos tiveram que começar a trabalhar para ajudar no sustento em casa, fora que muitos também ou não tem acesso à internet ou sequer portam instrumentos tecnológicos como smartphones, tablets ou computadores para que tenham acesso de fato a plataforma.

Neste momento de final de ano temos o período determinante da vida dos alunos que são os conselhos de classe, também conhecidos pela alcunha de COC. Nas discussões iniciais, pude perceber algumas posturas mais duras, de que o baixo acesso a plataforma fosse originado no desinteresse endêmico dos alunos ou que eles tivessem que se esforçar para garantir que a relação aluno x professor fosse atendida.

Como havíamos dito anteriormente, vivemos um momento de grave excepcionalidade, em que toda a sociedade foi afetada por uma doença que desestruturou o mundo inteiro. O momento avaliativo que começou a se deslindar neste momento deverá sem sombra de dúvida discutir não somente o processo de ensino-aprendizagem empregado, como também toda a conjuntura na qual ainda estamos passando.

Apesar dos fortes rumores de uma vacina eficaz para os próximos meses, professores e alunos ainda enfrentarão um vigoroso desafio de manutenção e fortalecimento dos sistemas de ensino, a adaptação a novos modelos de ensino-aprendizagem, como sistema à distância e/ou híbridos, e aos desafios hercúleos de natureza econômica que batem a porta de cada família, ainda mais aquelas mais desfavorecidas.

Por fim, o momento é de reflexão, parcimônia e, principalmente, acolhimento para com os alunos da rede pública de ensino. Se resumir como ação de avaliação a interação numa plataforma onde muitos alunos sequer tiveram condições de acesso é limitar o papel de professores e professoras que tem por principal responsabilidade serem educadores de uma sociedade com uma oceânica desigualdade econômica, social e educacional.

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